segunda-feira, 21 de novembro de 2011

PsiSaúde

Consideram alguns, tanto médicos como cientistas, que aquele que não sabe o que é o homem não poderia entender a arte médica e que precisamente isto deveria estudar quem deseja tratar adequadamente os homens...Eu creio, entretanto, que o que um tal médico ou cientista disse ou escreveu sobre a natureza pertence menos à arte médica do que a arte das letras...

O autor desconhecido destas linhas, redigidas ao redor do ano 350 antes de Cristo, parte do “Corpus Hippocraticum”, se expressa contra os conceitos especulativos dos filósofos naturalistas de seu tempo e destaca, no que Ackerknecht chama a primeira “rebelião empírica”, a preeminência da direta experiência junto à cama do enfermo.

Todavia, como observa Rothschuh, em seu livro “Concepções da medicina”, nunca se exerceu a arte de curar sem que, correlativamente, se intentasse fundamentá-la ou legitimá-la de algum modo. Ainda em épocas de mais cego empirismo, precisou a medicina de uma fundamentação para seu exercício - de uma teoria - que derivou, e ainda deriva, da necessidade do médico legitimar-se a si mesmo e à sua ação.

Deve responder a cada passo a pergunta sobre a sua eficiência e sobre a sua utilidade. O médico prático está impossibilitado de adquirir por si mesmo toda a experiência e toda a precisão teórica que necessita para tomar decisões às vezes cruciais.

Daí que a teoria médica cumpra uma segunda função, e é a de organizar o conhecimento afim de fazê-lo ensinável. Somente dessa maneira é possível dizer que há necessidade de educar alguém para ser médico. E é porque somente um corpo organizado de noções canalizará sua incipiente experiência e permitirá ordenar as observações, separando as relevantes das irrelevantes, selecionando diagnósticos e cursos de ação.

É aqui onde o “modelo de medicina” de uma época determinada - fruto da elaboração teórica, implícita ou explícita - cumpre um indispensável papel. É um instrumento de observação e uma ferramenta para o proceder terapêutico. Dá a este sua legitimação e abre as possibilidades da experiência.

As concepções fundamentais - os teoremas da prática- são a pedra angular sobre a qual descansa, primeiro, a imagem que de si mesmo tem o médico (pois, às vezes, será artesão, outras artista, outras cientista); segundo, a essência e formas da enfermidade (que, às vezes, será desordem dos humores, às vezes possessão diabólica, em ocasiões alteração da alma); terceiro, o substrato da enfermidade (às vezes será do órgão, ou da célula, ou do homem mesmo) e, certamente, a legitimação das terapêuticas.

As concepções da medicina compartilham também um substrato através do qual se enlaça a arte de curar ao resto da cultura de um época determinada: este substrato é a concepção do homem.

"O estudo próprio da humanidade é o homem”, diz Goethe a Ottilie em “As afinidades eletivas”. Seria difícil, em verdade impossível, que na medicina não existisse- manifesta ou latente - uma teoria do homem, uma antropologia.

Antropologia, em nosso sentido atual, é um acontecimento da incipiente Idade Moderna... A expressão antropologia para designar uma teoria científica do homem foi introduzida em 1501 pelo anatomista de Leipzig, Magnus Hundt, e a faz de imediato um programa que é representar a totalidade do homem, sua corporalidade e sua espiritualidade. É o intento de uma concepção global do homem, de unificar corpo e alma com a finalidade de sua saúde.
 
Bibliografia


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